15.3.11

Christine




















14.3.11

Ivampirismo - o prefácio de Ivan Cardoso


"Venho de uma outra escola. Após ter sido assistente de Rogério Sganzerla em SEM ESSA ARANHA e trabalhado em alguns filmes de Julinho Bressane, aprendi a fazer cinema em Super 8, que é uma espécie de "aprenda sem mestre". Por essas coincidências, por esses acasos, venho do cinema mudo. (...)

De maneira que sou o único cineasta oriundo do cinema mudo, com uma idéia na cabeça e uma câmera na mão, vindo de uma experiência extremamente lúdica e doméstica, que foi a série Quotidianas Kodaks, quando fizemos NOSFERATU NO BRASIL, A SENTENÇA DE DEUS, A MÚMIA VOLTA A ATACAR e CHUVA DE BROTOS, criando o grupo Ivamps, onde a estrela era a minha mulher, Helena Lustosa; os galãs, Ricardo Horta e Zé Português, meus melhores amigos; a Cristiny Nazareth, que sempre foi uma paixão da minha vida, e a Ciça Afonso Penna, que é meio minha prima. A Scarlet Moon, Daniel Más e Torquato Neto foram atores convidados. (...)

Como vocês podem perceber, sempre andei com vampiros, múmias e mulheres bonitas, desde o início... Quando percebi que não podia ficar fazendo Super 8 a vida inteira, porque só circulava entre amigos, parti para o chamado cinema profissional.

De início, tive muita dificuldade em me adaptar ao cinema falado: preferi fazer MOREIRA DA SILVA numa forma musical, sem depoimentos; nos documentários que fiz no Pará, MUSEU GOELDI e RUÍNAS DO MURUCUTU, o som era em off.

No primeiro filme onde usei fala, O UNIVERSO DE JOSÉ MOJICA MARINS, Zé do Caixão dá um verdadeiro show em som direto, numa série de entrevistas. Este filme marca também o início do meu trabalho como com o montador Gilberto Santeiro. Nesta série de curtas metragens, procurei fazer um painel de alguns artistas inventores, para que sua obra ficasse imortalizada.

Quanto voltei dos EUA, e 77, trouxe negativo preto-e-branco e uma câmera Beaulieu, a fim de recuperar a linguagem do Super 8 em 16 mm, e depois ampliar para 35 mm. (...)

E assim nascia O SEGREDO DA MÚMIA, que originalmente se chamava O LAGO MALDITO, sem uma história definida, apenas algumas idéias minhas e do Eduardo Viveiros. Com o legendário Wilson Grey no papel principal, assistido pelo maestro Júlio Medaglia e pelo fiel Igor, interpretado por Felipe Falcão, que até hoje foi a maior revelação masculina dos meus filmes, partimos para as filmagens, tendo como cenário o instituto Oswaldo Cruz, em Manguinhos.

Nos intervalos das filmagens, ainda tive tempo e fôlego para realizar mais dois documentários: Dr. DIONÉLYU e CINE-TEATRO NÔ, sobre Hélio Oiticica.

Com toda essa confusão, tivemos que dar um tempo na Múmia, porque estávamos aguardando um pedido de financiamento junto a Embrafilme.

Como filmávamos sem roteiro, as filmagens poderiam nunca ter fim... naquela época, é bom lembrar, existia uma "outra lei que ia dar certo" - a controvertida lei de obrigatoriedade de exibição de curtas nacionais, que é, na prática, o maior blefe, e acabou afastando nosso maior capital, que é o público....

Resolvi aumentar o meu late, transformando O LAGO MALDITO numa espécie de "fragmentos de um seriado incompleto". Como era um filme de múmia e em preto-e-branco, tinha todas as características de um autêntico classe B. A forma de seriado incompleto, também, resolveria o problema de não termos um roteiro definido... além de ser uma maneira diferente de entrar no circuito....

Para definir os episódios e escrever os diálogos, resolvi procurar um especialista, e, assim, fui bater à porta de Rubens Francisco Luchetti, o roteirista que Mojica havia me apresentado. (...) Após visionar nosso material, ele começou a criar os capítulos, mas, como todo criador de imaginação prodigiosa, nos enganou, escrevendo um outro filme.

Aí, felizmente, obtivemos um sim da Embrafilme, e produtor Zelito Vianna resolveu entrar no negócio (...) O resultado não podia ser outro: após cinco anos de exaustivos trabalhos, O segredo da múmia estava pronto, e acabou por surpreender a todos, conseguindo quebrar o gelo a que estava condenado o cinema experimental. Recuperando a velha tradição das chanchadas e de O bandido da luz vermelha, criamos um filme de vanguarda popular, que foi assistido por mais de 300.000 espectadores, conquistando vinte prêmios em festivais, sendo um deles internacional: o Festival de Cinema Fantástico de Madri.

O SEGREDO DA MÚMIA foi um grande sucesso no exterior. Aqui, conseguiu a proeza de ser um dos poucos filmes produzidos pela Embrafilme que se pagou, além de ter criado um novo gênero - o Terrir - que inaugurou besteirol antes do teatro. Uma múmia no Brasil.

(...) AS SETE VAMPIRAS foi um grande desafio, reunindo maior elenco já visto numa produção nacional, uma chanchada hitchcockiana para adoradores de cinema, uma colcha de retalhos classe B, repleta de "defeitos especiais" e sintonizada com os novos campeões de bilheteria americanos da espantomania.

Sempre duvidei da possibilidade de fazermos a terrível planta carnívora que devora o botânico no início do thriller, outra armadilha que o Luchetti me preparou. Sua realização deve-se unicamente à genialidade de Oscar Ramos, a quem carinhosamente chamamos de Super Ramos, ou Superamos, que cuida de todo nosso visual e sempre me tranquilizou.

AS SETE VAMPIRAS foi meu maior sucesso, uma verdadeira coqueluche nacional, tendo alcançado um público superior a 1.500.000 espectadores: conquistou nove prêmios, entre os quais o de melhor filme no Rio Cine Festival, o prêmio Kodak de fotografia, abalou Fantasporto, em Portugal - onde também fomos premiados - e participou de mais de dez festivais internacionais, sendo o filme brasileiro de maior sucesso de vendas no festival de Cannes, em 1987.

Daqui para frente, é bobagem ficar falando das peripécias d'O ESCORPIÃO ESCARLATE, meu novo filme, onde procuramos homenagear os anos dourados da Rádio Nacional, através de uma das mais criativas rádio-novelas e, sem dúvida nenhuma, a mais eletrizante: As aventuras do anjo, que, na verdade, não era uma novela tradicional, era um seriado de 10 minutos de duração diários, escrito e dirigido e protagonizado pelo genial a Alvaro Aguiar, que encarnava O Anjo, o famoso playboy detetive, desta vez em luta contra o temível Escorpião Escarlate, cuja história também será o assunto do nosso próximo livro."