 "Venho de uma outra escola. Após ter sido assistente de Rogério  Sganzerla em SEM ESSA ARANHA e trabalhado em alguns filmes de Julinho  Bressane, aprendi a fazer cinema em Super 8, que é uma espécie de  "aprenda sem mestre". Por essas coincidências, por esses acasos, venho  do cinema mudo. (...)
"Venho de uma outra escola. Após ter sido assistente de Rogério  Sganzerla em SEM ESSA ARANHA e trabalhado em alguns filmes de Julinho  Bressane, aprendi a fazer cinema em Super 8, que é uma espécie de  "aprenda sem mestre". Por essas coincidências, por esses acasos, venho  do cinema mudo. (...)
De maneira que sou o único cineasta oriundo  do cinema mudo, com uma idéia na cabeça e uma câmera na mão, vindo de  uma experiência extremamente lúdica e doméstica, que foi a série  Quotidianas Kodaks, quando fizemos NOSFERATU NO BRASIL, A SENTENÇA DE  DEUS, A MÚMIA VOLTA A ATACAR e CHUVA DE BROTOS, criando o grupo Ivamps,  onde a estrela era a minha mulher, Helena Lustosa; os galãs, Ricardo  Horta e Zé Português, meus melhores amigos; a Cristiny Nazareth, que  sempre foi uma paixão da minha vida, e a Ciça Afonso Penna, que é meio  minha prima. A Scarlet Moon, Daniel Más e Torquato Neto foram atores  convidados. (...)
Como vocês podem perceber, sempre andei com  vampiros, múmias e mulheres bonitas, desde o início... Quando percebi  que não podia ficar fazendo Super 8 a vida inteira, porque só circulava  entre amigos, parti para o chamado cinema profissional.
De  início, tive muita dificuldade em me adaptar ao cinema falado: preferi  fazer MOREIRA DA SILVA numa forma musical, sem depoimentos; nos  documentários que fiz no Pará, MUSEU GOELDI e RUÍNAS DO MURUCUTU, o som  era em off.
No primeiro filme onde usei fala, O UNIVERSO DE JOSÉ  MOJICA MARINS, Zé do Caixão dá um verdadeiro show em som direto, numa  série de entrevistas. Este filme marca também o início do meu trabalho  como com o montador Gilberto Santeiro. Nesta série de curtas metragens,  procurei fazer um painel de alguns artistas inventores, para que sua  obra ficasse imortalizada.
Quanto voltei dos EUA, e 77, trouxe  negativo preto-e-branco e uma câmera Beaulieu, a fim de recuperar a  linguagem do Super 8 em 16 mm, e depois ampliar para 35 mm. (...)
E  assim nascia O SEGREDO DA MÚMIA, que originalmente se chamava O LAGO  MALDITO, sem uma história definida, apenas algumas idéias minhas e do  Eduardo Viveiros. Com o legendário Wilson Grey no papel principal,  assistido pelo maestro Júlio Medaglia e pelo fiel Igor, interpretado por  Felipe Falcão, que até hoje foi a maior revelação masculina dos meus  filmes, partimos para as filmagens, tendo como cenário o instituto  Oswaldo Cruz, em Manguinhos.
Nos intervalos das filmagens, ainda  tive tempo e fôlego para realizar mais dois documentários: Dr. DIONÉLYU e  CINE-TEATRO NÔ, sobre Hélio Oiticica.
Com toda essa confusão,  tivemos que dar um tempo na Múmia, porque estávamos aguardando um pedido  de financiamento junto a Embrafilme.
Como filmávamos sem  roteiro, as filmagens poderiam nunca ter fim... naquela época, é bom  lembrar, existia uma "outra lei que ia dar certo" - a controvertida lei  de obrigatoriedade de exibição de curtas nacionais, que é, na prática, o  maior blefe, e acabou afastando nosso maior capital, que é o  público....
Resolvi aumentar o meu late, transformando O LAGO  MALDITO numa espécie de "fragmentos de um seriado incompleto". Como era  um filme de múmia e em preto-e-branco, tinha todas as características de  um autêntico classe B. A forma de seriado incompleto, também,  resolveria o problema de não termos um roteiro definido... além de ser  uma maneira diferente de entrar no circuito....
Para definir os  episódios e escrever os diálogos, resolvi procurar um especialista, e,  assim, fui bater à porta de Rubens Francisco Luchetti, o roteirista que  Mojica havia me apresentado. (...) Após visionar nosso material, ele  começou a criar os capítulos, mas, como todo criador de imaginação  prodigiosa, nos enganou, escrevendo um outro filme.
Aí,  felizmente, obtivemos um sim da Embrafilme, e produtor Zelito Vianna  resolveu entrar no negócio (...) O resultado não podia ser outro: após  cinco anos de exaustivos trabalhos, O segredo da múmia estava pronto, e  acabou por surpreender a todos, conseguindo quebrar o gelo a que estava  condenado o cinema experimental. Recuperando a velha tradição das  chanchadas e de O bandido da luz vermelha, criamos um filme de vanguarda  popular, que foi assistido por mais de 300.000 espectadores,  conquistando vinte prêmios em festivais, sendo um deles internacional: o  Festival de Cinema Fantástico de Madri.
O SEGREDO DA MÚMIA foi  um grande sucesso no exterior. Aqui, conseguiu a proeza de ser um dos  poucos filmes produzidos pela Embrafilme que se pagou, além de ter  criado um novo gênero - o Terrir - que inaugurou besteirol antes do  teatro. Uma múmia no Brasil.
(...) AS SETE VAMPIRAS foi um grande  desafio, reunindo maior elenco já visto numa produção nacional, uma  chanchada hitchcockiana para adoradores de cinema, uma colcha de  retalhos classe B, repleta de "defeitos especiais" e sintonizada com os  novos campeões de bilheteria americanos da espantomania.
Sempre  duvidei da possibilidade de fazermos a terrível planta carnívora que  devora o botânico no início do thriller, outra armadilha que o Luchetti  me preparou. Sua realização deve-se unicamente à genialidade de Oscar  Ramos, a quem carinhosamente chamamos de Super Ramos, ou Superamos, que  cuida de todo nosso visual e sempre me tranquilizou.
AS SETE  VAMPIRAS foi meu maior sucesso, uma verdadeira coqueluche nacional,  tendo alcançado um público superior a 1.500.000 espectadores: conquistou  nove prêmios, entre os quais o de melhor filme no Rio Cine Festival, o  prêmio Kodak de fotografia, abalou Fantasporto, em Portugal - onde  também fomos premiados - e participou de mais de dez festivais  internacionais, sendo o filme brasileiro de maior sucesso de vendas no  festival de Cannes, em 1987.
Daqui para frente, é bobagem ficar  falando das peripécias d'O ESCORPIÃO ESCARLATE, meu novo filme, onde  procuramos homenagear os anos dourados da Rádio Nacional, através de uma  das mais criativas rádio-novelas e, sem dúvida nenhuma, a mais  eletrizante: As aventuras do anjo, que, na verdade, não era uma novela  tradicional, era um seriado de 10 minutos de duração diários, escrito e  dirigido e protagonizado pelo genial a Alvaro Aguiar, que encarnava O  Anjo, o famoso playboy detetive, desta vez em luta contra o temível  Escorpião Escarlate, cuja história também será o assunto do nosso  próximo livro."